Daniel Santos

Viagens, leitura e recordkeeping

“Ler é viajar sem sair do lugar”.

Eu já ouvi essa frase e diversas variações dela milhares de vezes — e eu tenho certeza de que, se você gosta de leitura tanto quanto eu, já ouviu também. Para mim se trata de uma frase muito verdadeira, já que inúmeras foram as vezes em que eu me vi imediatamente transportado para lugares, mundos e culturas diferentes somente porque decidi abrir um livro pra ler.

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E é com essa frase, que associa leitura e viagens, que eu gostaria de falar de um assunto que, para mim, está bastante associado ao prazer da leitura: recordkeeping, ou a prática de registrar informações importantes para referência futura. Estou falando, mais explicitamente, de dois aspectos desse registro de informações. O primeiro aspecto está ligado a marcar, para cada livro que eu leio, seu título, autor, data de início da leitura, progresso da leitura (que pode ser tanto em número de páginas quanto em percentual, o que é mais comum no caso dos e-books) e data em que eu terminei a leitura (ou em que eu desisti dela, o que também pode acontecer).

Gosto de fazer isso pelo simples prazer de verificar quantos livros fui capaz de ler em um determinado ano. Se você me perguntasse, eu diria que não consigo ler o tanto de livros por ano que eu gostaria — por uma série de fatores os quais não vou listar aqui, mas que cada um de nós também vê influenciar suas próprias vidas em maior ou menor grau. Ainda assim, gosto de começar cada novo ano me desafiando a ler pelo menos 20 livros. Se eu consigo, fico feliz. Se eu ultrapasso 20 livros, fico feliz. E se eu não consigo chegar aos 20, também fico feliz, já que o importante é estar sempre lendo, sempre viajando sem sair do lugar.

Mas, é fato que, na leitura, a anotação de dados como o nome do livro, autor, data de início e de término da leitura e do progresso que já fiz está para a viagem assim como ter anotados o número do voo (ou do trem, ou da linha de ônibus), os horários de partida e de chegada e o número da plataforma ou portão. Ou seja, tais dados são apenas metadados da viagem (ou do livro), e anotá-los por si mesmos não é lá tão empolgante, não é mesmo?

É aí que entra o segundo aspecto da comparação que a frase que associa viagens e leituras me ajuda a fazer. Conforme progrido com a leitura de um livro, encontro uma série de passagens interessantes. Pode ser uma citação, pode ser uma fala de uma personagem que me atinge e me leva a lembrar de algo pelo que já passei, ou me ajuda a pensar em uma série de desdobramentos para algo que estou fazendo no momento, ou que me inspire a escrever. Pode ser a transcrição da história de uma personagem histórica, ou o que ocorreu com uma empresa. Pode ser mais uma série de coisas, desde que desperte em mim a sensação de que preciso guardar aquilo para conseguir consultar futuramente, desde que ative o comichão do recordkeeping. Essas anotações podem me ajudar posteriormente, com algo que estou criando, fazendo ou escrevendo, e por isso esse tipo de registro se torna importante para mim.

E qual é a relação entre este tipo de registro e uma viagem? Bom, para mim, é simples: quando estou viajando e encontro uma paisagem interessante ou muito bonita, tiro uma foto. Quando encontro alguém interessante, ou alguém que eu não via há muito tempo, também tiro uma foto. Quando vou a um monumento, guardo algo que me lembre da visita (como quando estive em Paris e pude subir e visitar a Torre Eiffel, e guardei o ticket que comprei como recordação). Em seguida, guardo as recordações todas que eu coleto em um álbum, uma pasta, ou qualquer outro meio, para que eu possa ver tudo de novo quando quiser. Recordkeeping.

O que tento ter em mente, no entanto, é que o recordkeeping não pode ser o fim, não pode ser a meta. Ou seja, assim como não é garantido que eu vá tirar fotos ou guardar recordações de toda e qualquer viagem que eu faça, também não é garantido que eu vá necessariamente encontrar passagens dignas de nota em todos os livros que eu for ler. Nestes casos, ficam apenas as anotações dos metadados, tanto para que eu não perca o horário do voo, quanto para que eu saiba que este ou aquele livro eu já comecei a ler, ou pretendo ler em algum momento. A receita não é garantida para todo mundo, pois todos temos experiências diferentes no que diz respeito à leitura. Mas é interessante tentar, para ver se é adequada ao seu estilo de viajante. Boa viagem.

#leitura #portuguese